sábado, 9 de maio de 2009

Miniconto



Do amor, da liberdade

Era de beleza inconteste. Alta, feição decidida, linda. É daquelas por que vale a pena qualquer esforço. Não se viam muito, mas sempre que podia ele subia os mais de 7000 km até a residência dela, e ia ao seu encontro, fazer o que sempre faziam, simplesmente contemplar. Ele contemplava ela, que contemplava o céu. Sempre dizia que ela parecia querer alcançá-lo. Ela não sabia o quanto significava para ele. Acima de tudo, era a representação máxima de seu ideal de vida. Ele a via como uma rainha, de coroa e tudo, uma santa, de deusa do olimpo, vestindo seu manto sagrado e, melhor do que isso, possuía a chama do amor, tinha-na em mãos, era o seu ideal. O seu ideal de liberdade. Eis que certa vez, viajou para outro lugar, não a visitou, mas ia, depois que resolvesse o que tinha para fazer do outro lado do país. "Mas o amor é forte demais", foi o que pensou, quando o avião teve que mudar de rota, completamente, para o lado oposto. Começou a ir em direção a ela, à sua morada. Não acreditava no que via, era ela, podia vê-la lá do alto. Ele pensava, "alcancei o céu, agora vou trazê-lo pra ti." Amou-a e olhou-a até o último instante, até a colisão, até ser privado de amá-la. E ela nunca soube que ele estava neste vôo, nem do seu amor, nem de nada, não podia amar, não era nada a não ser uma estátua em Nova York. Mas se vivo fosse, ele poderia jurar ter visto uma lágrima escorrer da Estátua da Liberdade.

Às vítimas do atentado de 11 de setembro de 2001, que foram privadas de amar em vida, pois homenagens não precisam ser feitas em data certa. Servem para resgatar a vida, e não para relembrar a morte.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Poesia de Gaveta nº 33

O que é que nos falta?

Não, não é sinceridade.
A mim, falta propósito.
Mas se eu nem entendo o que é propósito,
então por que devemos tê-lo?
Por que somos racionais?
Por que somos emocionais?
Por que não instintivos?
Que tipo de virtude é essa que temos de categorizar o mundo
e organizá-lo em nosso universo particular,
se o próprio universo é a representação máxima do caos?
Por que pensar em soluções?
E se eu deixasse levar?
Se eu deixasse que a natureza,
de onde vim,
guiasse o meu ser?
Às vezes,
paro e penso na minha vida.
Ela não me responde.
É por eu não ser racional?
Eu não sei categorizar?
Eu sou instintivo?
Humano, eu sou?
Por que perguntamos?
Vemos e duvidamos.
Somos corruptos,
desafinados,
sem harmonia.
Nada nos parece bom o suficiente,
exceto nós, os donos da dúvida.
...
Chegou a vida, tenho que ir.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

Serviço II


Music for the (smart) mobs

Poucas coisas realmente me tocam. De fato, chorei ao ver alguns filmes, ler certos livros e ouvir umas músicas, mas é bom que fique distinta aqui a diferença entre emocionar e tocar. Já não é tão rotineiro o primeiro caso, de quem fica a cargo filmes como Dançando no Escuro e Em Busca da Terra do Nunca ou livros como uns dois da série Harry Potter. São produções artísticas com muitas cenas voltadas ao ‘eu’, intimistas, que trazem à tona os nossos fantasmas e nos emocionam por perfurar-nos a carne com doses de interpretação, trilha sonora, diálogos bem construídos e uma pitada de talento do autor. Mas jóia rara mesmo é quando isso me toca, ou seja, quando além de tudo, eu vejo a sinceridade da preocupação com o mundo em cada frame, palavra ou acorde.

Eu não chorei ao ver Milk, mas foi um dos filmes mais tocantes que já vi, pois há cenas nele em que fica claro todo o sofrimento dos homossexuais para se afirmar e, mais ainda, a força que uma minoria pode ter, se unida. Um “ninguém” tornar-se líder político por meio da luta pela igualdade de direitos é sinceramente tocante. Imaginem quando o exemplo não está no passado nem nos Estados Unidos? Quando vejo um amigo, hoje, subir ao palco e cantar músicas sinceras sobre o mundo, músicas tocantes. E mais: quando cresce com essas músicas, as burila, criando todo um fluxo comunicativo para a mensagem que quer passar. A Caravana do Delírio, banda de Matheus e companhia, é tocante. À banda na qual acredito, às letras com que me toco, aos músicos com quem me divirto, dedico estas palavras sobre mim, que são muito poucas diante da grandeza das canções da banda. A Caravana é música para as massas, massas inteligentes, massa cinzenta. Música para o cérebro. Para se pensar mesmo. E eu penso que, se alguém se importa, são vocês, amigos. Mais uma vez e sempre, meus parabéns.