quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Jornalismo de Gaveta I




A função contemporânea do campo jornalístico


Na primeira aula da cadeira de Introdução ao Jornalismo, o professor da disciplina perguntou aos alunos qual era a visão deles acerca do jornalismo, tanto na sua prática, como na sua essência. À época, respondi irresponsavelmente uma “qualquer coisa” pessimista, mais a fim de demonstrar toda a minha desilusão juvenil do que de responder à pergunta do mestre. Acredito que, alguns meses depois, possa responder tal pergunta de forma menos irresponsável e, sem dúvida, mais satisfatória (para ambos os lados). Antes, porém, peço que se tenha paciência, pois se faz necessário todo um embasamento prévio à resposta tão almejada, ou seria apenas mais uma aleatoriedade.

Quando o jornalismo estava em suas raízes, e os meios de comunicação se aprimoravam, o filósofo Walter Benjamin falou sobre potencialidade. Apesar da aparente crítica à forma como os meios mais evoluídos reproduzem a arte de forma fria, exaurindo sua “aura”, Benjamin era muito otimista com relação à sua capacidade “democratizadora”. E cabia ao jornalismo essa função. Seria, para Benjamin, o difusor da arte, da notícia, das verdades, da produção cultural em geral. Para alguns, o filósofo alemão estava redondamente enganado. Fato é que, hoje, o jornalismo não é tão parecido com aquele idealizado por Benjamin. Pierre Bourdieu, um aclamado sociólogo francês, nos fala da influência que o campo jornalismo (seus mecanismos, na verdade) exercem sobre a produção cultural. Bourdieu assemelha-se mais a Theodor Adorno, tutor e companheiro de Benjamin, ao inserir o campo jornalístico numa “lógica de mercado”. Ambos concordam ao notar que diferentes jornais se parecem cada vez mais uns com os outros. Isso por causa de uma concorrência que leva os jornalistas todos a escreverem sobre as mesmas coisas, porém cada um criticando o outro, restringindo assim a diversidade de notícias. Porém, a crítica de Adorno a um jornalismo oportunista e manipulador da massa difere um pouco da visão “bourdieuriana”, que dá um tom um pouco (e só um pouco mesmo) mais inocente ao jornalismo, coloca o jornalismo numa posição de dependente do mercado – e por isso tão irresponsável.

Bem, o jornalismo, sujeito à lógica mercantil como é, não poderia deixar de usar seu grande poder de influência para fins lucrativos. E para isso, interfere sem a menor cerimônia em todos os campos de produção cultural, controlando-os, manipulando-os. Nesse âmbito, o campo artístico é uma das grandes vítimas. O campo político também é de suma importância, porém chamo atenção para uma questão bastante discutida nas Artes. O conceito de autonomia. Antes bastante essencialista, esse campo hoje não pode mais se enclausurar em ateliers e proclamar-se autônomo e elitista. E, voltando a Benjamin, isso tudo se deve basicamente à evolução dos meios de comunicação e ao surgimento – e crescimento – do campo jornalístico.

No campo político isso também é perceptível. Hoje, o jornalismo consegue, sim, através de sua influência, frustrar os planos de políticos de qualquer lado que for. Porém, mais do que isso, ele é capaz de fazer valer a opinião da maioria, de obrigar a política, através do povo, a “tomar jeito”. A pesquisa de opinião, por exemplo, quando não manipulada, é uma manifestação do potencial democrático do jornalismo. E quando é expressiva, quando surte efeito, uma representação da democracia no país.

Então, respondendo à pergunta que fiquei devendo desde o primeiro dia de aula, em minha opinião o jornalismo tem hoje por função, para o bem ou para o mal, democratizar o acesso à produção cultural. Visando o lucro ou não, isso é um ponto positivo do campo. Porém, fica aqui minha crítica à forma como é praticado o jornalismo em alguns lugares. Irresponsável ao cuspir notícias falaciosas, estapafúrdio ao se corromper em troca de lucro. E (fica a crítica também) àqueles jornalistas que, em nome de sua vaidade, recusam-se a denunciar toda sujeira em que pisam todo dia.


1 colaborações:

Girabela disse...

O penúltimo parágrafo lembrou meu trabalho sobre opinião pública e políticas públicas.

No mais, sua resposta foi, sim, bastante satisfatória.